A melhor explicação.
Conheci o Soró no Pacaembu, em dia de jogo do Timão e, mais para frente, fui saber que ele era militante do partidão, feito eu.Na militância, ele era de poucas palavras, quase ninguém notava a sua
presença, no estádio se soltava, exaltava o time do parque, balançava a
bandeira, batia tambor e xingava a mãe do juiz, feito esses malucos de
torcida organizada e, em 1980, haviam poucos deles.
O Soró não era paulistano, era cearense e natural do Crato, no entanto,
se alguém perguntasse do Fortaleza e do Ceará, ele fechava a cara e
tascava:
_Não faço ideia do que você está falando, nasci maloqueiro e vou morrer corintiano.
Se o sujeito insistisse nesse caminho, ele engrossava e mandava tomar no...
Como nessa época, quem mandava em tudo era o Doutor, usando tática de
guerrilha, invadimos o estádio várias vezes e, também fomos encaminhados
ao departamento de polícia, como éramos menores de idade, nem
chegávamos a ficar em celas.
Ele morava numa pensão na avenida
Liberdade e eu alugava um quartinho na rua dos Estudantes e concordamos
que o melhor lugar para apreciar uma boa cerveja, era na rua Maria
Paula, bem de frente pro viaduto e São Paulo toda na porta da rua.
Num domingo morno, quando o sol caia por cima da cordilheira de prédios da 23 de Maio, iniciei uma prosa:
_Meu amigo Soró, como pode um cara que nasceu no Ceará, ser fanático
por um time da capital, veja, eu sou nascido no Bexiga, filho e neto de
corintianos, isso é normal, ninguém vai estranhar...agora, um cara do
Crato, tem paciência Soró.
A garrafa da mesa já se findava, bebeu
aquele restinho que ainda estava no fundo do copo, numa tranquilidade de
quem só estava começando, levantou a mão para o garçom, mostrou dois
dedos para ele, assim que se fez entender pelo garçom, respirou fundo e
olhou na minha direção, com a maior calma do mundo disse:
_Caro
amigo Niltão, não é por ter nascido nessa terra ou por razões de
hereditariedade que você é corintiano.Você é corintiano de verdade,
porque lhe faltam alguns parafusos na cabeça.
O garçom chegou com as
garrafas e encheu os copos, sob a nossa vista, virou os copos para que o
colarinho não fosse muito grande, eu já ria esperando o fim do
pensamento do amigo.
Estalou os dedos no ar, como se isso fosse ajudá-lo a lembrar o ponto que havia parado a conversa...Ah sim, parafusos.
_Então, a mim também faltam os parafusos, a única diferença é que eu nasci no estado do Ceará.
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